Eu quero, posso e mando… criar quase nada
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Era uma vez um país que já não existe.
Nesse país mandava um senhor chamado Estaline.
Fechou no armário algo leve e vermelho. Olhou para as suas botas de cossaco e calçou-as.
Estaline sentiu-se de novo em forma, encheu o peito de ar e abriu a grande porta que dava para a sala de reuniões. Os seus camaradas conselheiros esperavam-no. Avançou para o topo da mesa e sentou-se. Os restantes sentaram-se também.
– Mas que é isto? – perguntou furioso Estaline, batendo com o dossier na mesa.- Gastou-se tudo isto em cinema?
– Sabe que a nosso politica cultural é muito forte e o cinema é um veículo importante para construir o caminho socialista – alegou um dos conselheiros.
– Tal e qual como fazem os capitalistas, que utilizam o seu cinema para propagandear a sua sociedade decadente e injusta – acrescentou outro conselheiro, mais pequeno e nervoso.
– Sim, mas há que ter algum controlo nisto, capitalistas ou socialistas as coisas não nascem do chão – contrapôs Estaline. – Quanto filmes é que fazemos por ano?
– Constam do programa orçamental do plano cinematográfico 100 obras por ano – respondeu o primeiro conselheiro.
– E desses, quantos é que são realmente bons?
– Em média só 10 é que são mesmos bons filmes.
Estaline dá um grande murro na mesa e levanta-se.
– Mas como isso é possível? O desperdício é uma coisa de capitalistas. Na nossa sociedade produz-se apenas o necessário e aquilo que é bom. Está decidido, para o ano produzir-se-ão apenas 10 filmes de qualidade. Tratem de chamar para a produção cinematográfica apenas o que de melhor temos na nossa Pátria.
Chamaram os melhores escritores para escrever os argumentos, os melhores técnicos para iluminar, os melhores realizadores de sempre ainda vivos para filmar: iam ser feitos 10 grandes filmes de qualidade.
No ano seguinte, Estaline voltou a reunir-se na mesma sala. Quando olhou o dossier sobre o cinema ficou radiante. Os custos tinham diminuído 90% e, supostamente, voltava a ter os mesmos 10 filmes de qualidade.
– Estão a ver? Com muito menos dinheiro temos novamente 10 filmes de qualidade, aqueles que realmente interessa ver – afirmou Estaline convictamente. – Esbanjar recursos em 90 filmes sem interesse era coisa de capitalista. Agora sim, temos uma produção cinematográfica plena de qualidade e verdadeiramente socialista. Não temos, camaradas?
Fez-se um longo silêncio, os conselheiros olharam uns para os outros.
– Passa-se alguma coisa que eu não saiba? – berrou Estaline.
– Camarada… – balbuciou um dos conselheiros timidamente – acontece que dos 10 filmes não saíram… todos propriamente bons.
– Como assim? Quantos filmes afinal é que ficaram com qualidade?
– Apenas… Um.
Estaline entrou no seu quarto e fechou com força a porta, deixando para trás os conselheiros na sala de reuniões. Num ataque de fúria apanhou uma almofada e disparou sobre ela. Milhares de penas esvoaçaram.
Abriu a porta do seu armário e olhou fixamente os objectos da sua paixão. Precisava urgentemente de descontrair. Descalçou as suas botas negras.
Olhou um lote enorme de plumas, teve dificuldade em escolher a cor, mas decididamente que naquele dia não ia optar por vermelho. Pegou na estola de plumas azul, enrolou-a à volta do pescoço e rodopiou feliz ao som do La Vie en Rose, da Piaf, que entretanto tinha colocado na grafonola.
Moral da história: A única fórmula conhecida para a qualidade é a quantidade, a perfeição na arte aperfeiçoa-se.
O bom nunca é um fim mas apenas uma tentativa.
Historieta baseada numa anedota que me foi contada na Bielo-Russia.
plumas…… faz-me lembrar a ‘bússola dourada’, com o robert de niro num papel leve, mas verdadeiramente brilhante
quase na mouche, foi inspirado numa personagem do Bob, aliás no post original (no sol) eu escrevi essa citação, mas o filme é o Stardust e não a Bussola
olá olá olá….
essa das plumas também me fez lembrar a figura do capitao gancho …
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mas se é verdade que é verdade que só há verdadeiramente qualidade quando ha quantidade…
também é verdade de uma verdade bem verdadeira que se gasta muito dinheiro em filmes pagos para sertem verdadeiramente asquerosos…
pronto… mas isto devo ser eu com a mania de pensar pela minha cabeça e de achar que verdadeiramente há por ai muita gente a ganhar…
beijinhos
minda
minda
sim é verdade que se faz tanta porcaria, mas sem ela não aparecem as verdadeiras pérolas, é quase impossível fazer coisas muito boas se não diversidade